Minha mãe, minha heroína...
Quando criança o medo por cachorros sempre foi um
problema para mim e minhas irmãs. E eu, bem novinho, com quatro anos apenas,
tinha pavor de qualquer tipo de cão. Eu sempre fui muito bem protegido por
minha mãe. Nada chegava perto de mim se ela não permitisse, e eu me confiava
nisso. Mas, ainda assim eu me aventurava pela porta de casa. Gostava de
brincar, correr, jogar bola, empinar pipa. Era desse jeito que se brincava em
minha vizinhança. Porém, alguns alertas estavam fixados em minha mente.
O medo por cachorros, como eu já disse, era
anormal. Então, eu sabia os perigos que eu podia correr andando sozinho por aí.
A vizinha do lado adorava cachorros. Ela tinha dois, uma fêmea e um macho. Seus
cães não eram grandes, porém eram valentes. Ambos latiam muito e isso me dava
calafrios. Bastava passar pela calçada em frente ao portão da casa que já
começavam os latidos eufóricos. O pavor tomava conta de mim.
Todos os dias, ao tirar seu carro da garagem, a
vizinha deixava escapar um, ou os dois cachorros. Eles faziam a festa na rua:
latiam com qualquer um que passava. Duravam sempre alguns segundos, mas o
suficiente para amedrontar a mim e a minhas irmãs, de tal modo que nos faziam
entrar em casa o mais rápido possível. E como já isso era de praxe, conhecíamos
bem o som que o portão da vizinha fazia ao ser aberto. E ao ouvir aquele
barulho, pronto, o desespero tomava de conta. “– Tuca, volta já pra casa!”
Gritava a vizinha com sua cachorra.
Lembro-me bem de uma manhã em que a área em frente
minha casa estava repleta de lençóis e roupas no varal, para secar. Minha mãe usava
uma camisa amarela, que estava um pouco molhada na barriga, por conta da
lavagem das roupas. Em um segundo que passei pela área e fui à rua, em frente
casa me desconcentrei e o pior aconteceu: ouvi aquele barulho; o portão havia
sido aberto! Em seguida outro barulho; a vizinha gritou o que eu não desejava
jamais que ela gritasse: “-Tuca, pode já voltar!”
Como por extinto, olhei para trás a fim de saber o
nível do perigo. E em uma fração de segundos pude ouvir o som das unhas da
cachorra batendo no asfalto. Era ela, a Tuca, e vinha em minha direção. Parecia
que o mundo havia parado de girar. Mas eu não! Fiquei correndo em círculos, e a
cachorra atrás de mim, latindo, babando. E eu correndo, girando. Dei uma volta,
duas voltas, três voltas, e a cada volta soltava um berro: "-Mãããe! Mamãããe!
ÊÊÊÊi mãããããe!" Até que em umas das voltas fiquei de frente para o portão de
minha casa. E quase como um foguete, disparei para dentro de casa.
Ao entrar eu vi, entre aqueles lençóis secando,
minha heroína. Minha mãe que, ao ouvir meus gritos de socorro, correu em minha
direção. “– O que foi meu filho? O que foi?” E eu a abracei. Ela me acalmou. E
em seus braços voltei a me sentir seguro. Aquela imagem nunca saiu de minha
cabeça. Nem a imagem nem o abraço. Nem o abraço nem aquele sentimento de
segurança.
Minha mãe, minha heroína...